quinta-feira, 8 de abril de 2010

O Surgimento de um Caudilho

Logo depois da eleição de Lula pela primeira vez, em 2002, um cientista político espanhol (Ludolfo Paramio) publicou um ensaio em que previa para a América Latina uma guinada à esquerda. Menos de oito anos depois, o que se vê é uma guinada a um modelo de democacia personalista/paternalista de partidos ou de grupos de partidos dominantes, com semelhanças (felizmente com mais diferenças) com a era do populismo que marcou o Brasil do início do século passado, que foi seguido pelo ciclo de ditaduras militares, marcantes em boa parte dos países latino-americanos depois da metade do século até a década de 90. A transição à democracia se deu em um contexto econômico conturbado de alta do petróleo e de hiperinflação, que resultaram na adoção de políticas macroeconômicas de tendência neoliberal – privatizações, corte de gastos e de benefícios sociais.

Foi esse cenário que forjou a maioria das lideranças políticas que hoje manda no País e que serviu de pano de fundo às mudanças políticas que ocorrem hoje na América Latina, predominantes (guardadas as vicissitudes) em países como Venezuela, na Bolívia, no Brasil, Chile, Equador, Argentina, Uruguai, entre outros. O cientista político gaúcho (UFRGS) Benedito Tadeu César afirma que o panorama que se vislumbra é o contraponto do passado e que assim hoje “vivemos um momento muito rico, que não é um retorno ao velho populismo nem o trilhar de uma esquerda tradicional. Trata-se da busca de uma alternativa a esse modelo hegemônico que nenhum de nós sabe ainda o que é”. Podemos ainda não ter um rótulo perfeito, mas estamos vendo muito bem o que é. Vivemos hoje, como no passado, uma democracia (eleitoral) de fachada para manter o velho sistema político paternalista/populista. Claro que os excessos do modelo são diferentes hoje, assim como as demandas e a economia. Os problemas hoje são quase sempre de ausência do Estado, que não pode exercer suas competências e que não chega a todas as regiões e cidadãos. A visão econômica de mercado predominante desde a transição vem provocando um ciclo vicioso. O mercado concentra riquezas, concentra poder e fratura a sociedade, fazendo crescer as brechas sociais e afetando a coesão social.

Estavam gestadas as condições propícias para tecer os caudilhos. Lula, arrimado em um sistema eleitoral (que permite a reeleição imediata) e de partidos fracos, transformou-se em um caudilho verborrágico e autoritário, acariciando o capital e impondo suas vontades. O modelo espalhou-se por todas as regiões, especialmente nas mais pobres, com apoio explícito ou velado da corte planaltina. Lideranças que cresceram e apareceram na luta da transição à democracia, como Tasso Jereissati, negaram o passado e aderiram, no ocaso de suas carreiras políticas (na tentativa de prolongá-las), aos novos modelos caudilescos oligárquicos produzidos no início pelo discurso “tassista” das “mudanças” e estabelecido na maré que recebeu o codinome de “onda vermelha”.

Da mesma forma que Lula tenta empurrar a indigesta Dilma Rousseff, o chefe Jereissati, detentor de alentado poder financeiro e político, tenta inviabilizar as oposições do Ceará. Costura à socapa uma aliança regional espúria com a família Ferreira Gomes, que já abriga em seus longos braços o governo do Ceará e parcela ponderável do poder central. Em sua ambígua posição, desrespeita e zomba até dos acordos que foram firmados em nível nacional em torno de uma candidatura de oposição. Jereissati (chefe do PSDB), que seria o líder da oposição no Ceará ao lado de PR, PPS e DEM, conspira por um arrastão eleitoral do candidato da situação, Cid Gomes, e leva a reboque os setores caudilhescos do DEM. Deixando só e sem tempo o grupo divergente do DEM e o PPS, enquanto o PR se contrai em crise existencial.

O arrastão eleitoral é um jogo perigoso, que sofre ameaças internas, com ameaças de fissuras na base de apoio do Governo, caso seja formalizado (que não será) o apoio do PSDB. A ameaça interna, que é somente um estratégia de ocupação de espaço, não ceifará o ânimo da oposição. A bandeira oposicionista será hasteada por um candidato, juntando o PPS, DEM e PR, mesmo que o poder caudilesco impeça a formalização da aliança e que tenhamos de enfrentar um latifúndio de tempo na TV e no rádio e o poder econômico.

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