Fortaleza-CE. Um dia depois da passeata contra a violência
(Fortaleza apavorada) o governador Cid Gomes (PSB) reapareceu. Estava
acompanhado do seu prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, claro que também do
PSB, e prestigiava a posse da desembargadora Iracema Vale na presidência do TRE.
O ambiente estava coalhado de pessoas pagas pelos impostos dos cidadãos, ou
seja, deputados, secretários, vereadores, afora o governador do Ceará, o
prefeito de Fortaleza e diversos representantes do Judiciário.
No primeiro ressurgir, o representante governador do clã
Gomes agiu como se nada tivesse acontecido e se fez de desinformado quanto denúncia
de infiltração (na passeata) de partidos e integrantes das “milícias”. Afirmou
que o que houve foi notícia de que teriam pessoas infiltradas. “O governo teve
a preocupação de alertar”. Acrescentou que houve também informações de que
partidos se infiltrariam. “Alertamos e pedimos acompanhamento, mas não tenho
detalhes”.
Para o senhor governador cearense, a nota cumpriu seu
objetivo, “que era respeitar o movimento e que acontecesse em paz. Talvez se
nós não tivéssemos soltado a nota, movimentos políticos teriam se infiltrado,
movimentos militares teriam se infiltrado”. Cid Gomes minimizou também a
importância política do evento, revelando não estar nem um pouco preocupado com
2014, não por excesso de confiança, mas porque ”não acho razoável misturar
política com segurança”.
Pelas declarações do senhor governador, quem pensava que a
nota divulgada no dia anterior ao da passeata fosse do secretário Danilo Serpa
sabe agora que ele apenas foi o obediente canal, substituindo o canal
costumeiro, que era o secretário ventríloquo, Eduardo Diogo, que está
desgastado pelo caso dos consignados e pela negociação interrompida com os PMs
grevistas de 2012. As respostas evasivas do senhor governador revelou que ele
mesmo elaborou a nota. Ora, a nota não teve o objetivo de alertar, mas sim de
intimidar os participantes. Infiltrados não havia e tampouco qualquer notícia
nesse sentido circulou, a não ser nos gabinetes do Palácio governamental. O que
havia – e não deu para disfarçar – era um pesado esquema de “acompanhamento” do
governo.
Por fim, sem pensar muito, o senhor governador soltou a
pérola de sua fala: “...não acho razoável misturar política com segurança”. Foi
só o que ele (e seu grupo) fez nas campanhas e nos seis anos e pouco de mandato.
Tudo foi planejado minuciosamente para bombardear a passeata. Tiraram página do
ar na Internet (tem alguma coisa a ver com espionagem?), depois devolvida, e
até mandaram o prefeito Roberto Cláudio antecipar declarações apressadas sobre
o reforço da Guarda Municipal, anunciando entrega de viaturas e contratação de
mil guardas, sem sequer ter a data do edital de convocação do concurso. A nota,
que ameaçava a todo mundo, foi a tentativa final de fazer michar o movimento.
Debalde. A passeata foi um sucesso, trilhando o caminho do “Estado integral”, definido
por Gramsci.
O que mais deve ter doído no senhor governador foi perceber
que a sociedade civil, limpa, descartando os desgastados partidos e
associações, principalmente ligados à dita esquerda, botou a cabeça de fora e quer
ampliar o papel do Estado - não apenas aparelho coercitivo, mas também aparelho
de hegemonia, voltado para a conquista do consenso. Por isso é que o
segundo ressurgir veio em tom diferente. Mesmo com uma clara falsa humildade, o
senhor governador disse que encara “com o maior respeito toda e qualquer
manifestação honesta, em qualquer área e, de modo muito especial, na área da
segurança”. Informou, macio, que já pediu apoio da Polícia Federal, no caso dos
homicídios, já que 80% são decorrentes no tráfico de drogas. Garantiu também
que vai ampliar investimentos na segurança e se declarou aberto às sugestões do
movimento: “as sugestões que o movimento tiver serão muito bem vindas”. Em
seguida, exagerou ao afirmar que ele e o secretário de Segurança, Francisco
Bezerra, estarão disponíveis para reuniões com os ativistas. “As pessoas não
têm barreiras pra falar comigo. Então, qualquer sugestão é bem vinda”,
completou sem corar.
Nada saiu como pensou o senhor governador do Ceará, Cid
Gomes (PSB). A aposta era que o movimento, batizado de Fortaleza Apavorada seria pífio como a marcha contra a
corrupção. Erro. A passeata contra a violência foi um sucesso, reunindo mais de
10 mil pessoas e deixando um recado preocupante: chegaram ao limite. Estão fartas de desculpas e de ver ser gasto
um rio de dinheiro com o que não funciona. Cid saiu de Sobral para governar o
Ceará depois de dois mandatos. Chegou acompanhado de alguns assessores, como o
coronel Francisco Bezerra, que montou e comandou a Guarda Municipal daquele
município e hoje é secretário de Segurança. E conquistou o poder montado em um
programa de combate à violência (Ronda do Quarteirão), adaptado de uma proposta
que o ex-deputado Moroni Torgan (DEM) havia montado para a Guarda Municipal da
Prefeitura de Fortaleza, na campanha de 2000, repetidas na eleição de 2004 e
2008.
Eleito (2006), o governador cumpriu a promessa e montou, com
Hilux, policiais escolhidos (grupo de elite) e uma intensa campanha
publicitária, o Ronda do Quarteirão. A lua de mel durou até a reeleição dele em
2010. Logo no início do segundo mandato, começou a derrocada do Ronda, que nunca
conseguiu baixar realmente os índices da violência. Descobriu-se que o programa
era caro, ineficiente e objeto de discórdia na PM. Em Pernambuco, o governador
Eduardo Campos, do mesmo partido do clã Gomes (PSB), conseguia melhores
resultados na segurança, usando peruas Parati, um quarto do preço da luxuosa e
automática caminhonete Hilux. A partir daí, começou um jogo de faz de conta,
enquanto o povo sofria as consequências de uma violência crescente. Até agora,
pelo que sabemos, só quem ganhou com o Ronda
foi a New land, concessionária da Toyota, ainda que o deputado estadual Heitor
Férrer (PDT) diga que há mais ganhadores. Como governador, secretário e
comandante da PM, o autossuficiente Cid (e os irmãos Gomes. Ciro também foi
assim) deve repensar o modelo oligárquico. O estilo que você deve recordar (conversa
entre ele e o eufórico Pio Rodrigues na festa de fim do ano do Coopercon-CE,
sobre a linha Leste do VLT: “...eu desaproprio e você faz. Depois a gente faz
um rolo...”) pode ser substituído pelo diálogo, pelo consenso. Basta ver a escalada
dos movimento dando lição por todo o Brasil.
Só para recordar, reveja o diálogo Cid-Pio:
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