A imprensa nacional e até a internacional e alguns blogs publicaram que os serviços de inteligência do Brasil suspeitam que está sendo preparada uma luta armada entre grupos que cobram proteção contra os narcotraficantes em Rio das Pedras-RJ. As organizações são integradas por ex-militares ou ex-policiais. O temor é que ocorra uma guerra entre os grupos pelo controle dos milionários recursos que cobram à população. Quando se lê uma notícia dessa a primeira reação é pensar que no Rio de Janeiro a situação já está sem controle (pelo Governo, em qualquer nível). Não é bem assim. A situação que é denunciada, e que fizemos questão de trazer para refletir com vocês, já está acontecendo também aqui em nosso quintal. Uma senhora humilde que abordei num terminal, antes de entrar no ônibus que a levaria para o Jenibaú, ao lado do conjunto Ceará, logo depois do Maranguapinho, me disse que quando sai de casa para trabalhar como doméstica numa casa na Aldeota, leva o dinheiro da passagem (ou vale transporte) e mais R$ 2,00. Este valor é o pedágio que ele paga todo dia à noitinha para atravessar da parada onde desce até sua casa. Cerca de 500 metros de ruelas escuras e com água servida correndo em valas improvisadas. Será que isso só ocorre no Jenibaú?
O RONDA DEIXA A FASE DE EXPERIÊNCIA
Como anunciou o governador Cid Gomes, que desfilou em carro aberto pela cidade acompanhado pelos 200 carros marca Hilux e pelas 500 motos, o programa Ronda do Quarteirão entra agora em abrangente fase de execução. Não serão mais os 4 bairros, mas toda Fortaleza e alguns municípios do Ceará (ainda não é possível todo o Estado). 900 novos policiais saídos do forno vão assumir o serviço. Claro que vale parabenizar o governador pela pertinácia em implantar e fazer funcionar o programa. Torcemos para os resultados sejam alentadores (e serão), embora acreditando que são necessárias mais algumas providências. A questão da segurança só pode chegar a uma solução sustentável através de um trabalho integrado de todo o governo em parceria com a sociedade. Mas não é o caso de aprofundarmos agora esta questão. O que está em tela é o barramento da escalada da violência, que o Ronda tenta fazer. O que é o Ronda? É um programa de policiamento motorizado ostensivo e preventivo. É suficiente para barrar o crime? Não. Vai inibir algumas ações em algumas áreas, o que já representa um ganho considerável. É muito mais do que os governadores anteriores fizeram.
NÃO PRECISA CAMUFLAR
Vamos pegar o caso do “arrastão” (negado pelas autoridades) ocorrido no dia 22, sábado, no centro de Fortaleza, véspera do desfile pela cidade em carro aberto, para reflexionar o complexo problema. O centro, como diz o próprio governador, tem uma malha xadrez, propensa, portanto, a demorados engarrafamentos, principalmente em virtude do período natalino, com atrações lúdicas e promoções do comércio. Foi, por tudo isso, escolhido pelos marginais. E por que? Simples, por pelo menos meia hora, o centro estaria sob a vigilância apenas dos poucos policiais que faziam o patrulhamento a pé. A Hilux ficaria presa no engarrafamento e só as motos poderiam chegar mais rápido. Mesmo assim, no tumulto gerado, como foi o caso, levaria tempo para que fosse possível localizar o foco do ato criminoso, tempo suficiente para que todos fugissem. É assim, os criminosos também pensam, tem equipamento e preparo para executar a ação. Também não é mera coincidência que os assaltos (inclusive a bancos) se intensificaram no interior do Estado e Região Metropolitana. O crime se muda. Por tudo isso, não precisava tanto esforço das autoridades para negar o “arrastão”. Houve, sim, e outras ações vão ocorrer. Sabemos do esforço do Governo e o louvamos por isso. Negar não honra este esforço.
POLICIA DE PROXIMIDADE
(ou o infame trocadilho da polícia da boa vizinhança)
Fazer policiamento ostensivo preventivo não tem mistério. É feito hoje da mesma forma que no início do século passado. Hoje, a tecnologia ajuda e dá mais agilidade, mas as cidades se tornaram megalópoles de complicada malha viária e habitacional e enormes contradições sociais, que permitem, como no Rio e já há alguns focos em Fortaleza, a presença de um “estado” pela ausência do outro, contrariando o que diz Max Weber: o Estado tem o “monopólio da violência legítima”. O serviço do policiamento a pé é a mais antiga forma de patrulha. Segundo o escritor Paolo Napoli (Naissance de la Police Moderne. Pouvoir, Normes, Societé, Paris, Éditions la Découverte, 2003) foi a partir da noção de itinerância a pé que se criou a idéia mesmo de policiamento, na expansão de um modelo de “polícia das cidades para o Estado” desde o século XVIII. Já o policiamento Motorizado (incluindo Hilux) é recente na história da polícia brasileira. Ganhou expressão nas maiores cidades do país, principalmente com a introdução rádio (ou intercomunicadores) para resposta a emergências, a partir da década de 1960. Significa dizer que fazer policiamento ostensivo preventivo é colocar polícia nas ruas, como está sendo feito. Mas não fica só nisso. O policiamento deve ser integrado, falando somente do aparato policial. Melhor dizendo, é preciso fazer funcionar o que os estudiosos da área chamam de os quatro tipos de policiamento: polícia de proximidade, polícia de investigação, uma polícia de interpelação e uma polícia de terreno. Combinar esses tipos de polícia não é impossível. Todos tomamos conhecimento do negado “arrastão” do centro. É a prova de que somente colocar duplas “cosme e damião” ou patrulhas Hilux e motos na cidade –vai reduzir- mas não vai resolver o angustiante problema de segurança ao cidadão. E depois daí virão a Justiça e as leis, as ações sociais, a educação, o emprego, a moradia...
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